Inteligência Artificial – Aplicações no Judiciário – Segunda parte

Inteligência Artificial – Aplicações no Judiciário – Segunda parte

Inteligência Artificial – Aplicações no Judiciário – Segunda parte

 

Caros amigos da Laranja & Marranghello, daremos continuidade ao artigo sobre a apresentação feita no 4º Seminário L&M que ocorreu no dia 15 de setembro de 2022 sobre Inteligência Artificial suas aplicações no Judiciário e os cuidados com as decisões automatizadas.

Destaco o excelente conteúdo utilizado na confecção deste texto e referenciado ao final, em especial aos estudos elaborados pelo Doutor Gustavo Rocha (gustavorochacom.com.br), aos livros do Professor Fabiano Hartmann Peixoto e dos Doutores Daniel Arruda Boing e Alexandre Morais da Rosa. São textos e livros que valem a pena ser lidos!

 

Abordagens do uso do aprendizado de máquina no judiciário brasileiro

O acervo de decisões existentes nos bancos de dados de jurisprudência e mais recentemente nos sistemas de processo eletrônicos implantados em todo o país é gigantesco e, como aprendemos, os algoritmos são especialistas em encontrar padrões e o fazem com velocidade e precisão milhares de vezes superiores aos dos seres humanos.

Para o desenvolvimento do uso do aprendizado de máquina no judiciário brasileiro, são utilizadas principalmente três diferentes abordagens, usadas individualmente ou combinadas.

A primeira delas corresponde ao algoritmo classificador, através dos quais os algoritmos auxiliam humanos em tarefas básicas, tais como encontrar e classificar processos. São muito utilizadas para validar as distribuições de processos ou em etapas iniciais de avaliação de admissibilidade.

A segunda abordagem é a do algoritmo parecerista, que consiste em condensar informações relevantes de um processo em um único documento, que eventualmente pode ser utilizado para sugerir decisões a um caso concreto, ou seja, servirá de embasamento para uma decisão humana. Já existem algoritmos criadores de resumos, que podem ser usados na elaboração dos relatórios nas decisões ou para estabelecer um roteiro prévio de quais tópicos o julgador ou advogado (ao elaborar suas petições e recursos) devem analisar.

A terceira e última, algoritmo julgador, consiste em um passo adiante, já que seus resultados são considerados vinculativos e elimina-se do processo decisório completamente o componente humano, que se torna uma instância revisora. Como vimos nos conceitos  anteriores, neste momento da aplicação da tecnologia ainda estamos falando em aprendizado de máquina supervisionado, ou seja, os algoritmos não criam decisões inovadoras, mas apenas buscam padrões semelhantes ao caso em estudo na base de dados de decisões que já foram tomadas. Um pedido inédito não poderá ser resolvido usando esta abordagem.

Para finalizar, acrescento que os principais estudos sempre se referem ao trabalho dos juízes, mas precisamos considerar o importantíssimo papel do advogado. As três possibilidades citadas também se aplicam a um escritório de advocacia, tanto na coleta de informações (classificador), na formulação de alternativas ao processo (parecerista), quanto no julgador, ao desenvolver as peças processuais que farão parte do processo ou até mesmo para avaliar a possibilidade de vitória em determinada tese com os argumentos selecionados.

 

Inteligência Artificial – Experiências nos Tribunais Brasileiros

Veremos como a IA é empregada no Judiciário Brasileiro.

Como sabemos, são aplicações que acessam um grande volume de dados para análise de textos, necessitam de um problema específico a ser enfrentado e participação humana para treinar o algoritmo e calibrá-lo. Usam algoritmos de que analisam os termos e expressões utilizados, de acordo com o contexto, agrupando e categorizando. Depois os algoritmos são programados para executar determinadas ações de acordo com as categorias de textos.

Listo algumas iniciativas.

O Mandamus do Tribunal de Justiça de Roraima. Automação do processo de distribuição de mandados. É a aplicação que faz a gestão da Central de Mandados, auxilia na distribuição, nos processos de localização do oficial de justiça e da pessoa que vai receber o mandado. Também atualiza os dados referentes aos endereços das partes; faz a citação ou intimação em tempo real, diminuindo a burocratização, e pode ser usado como aplicativo no celular ou tablet do oficial de justiça, que imprime o mandado em uma impressora portátil.

O projeto conta com os seguintes objetivos específicos: mapear os dados judiciais sobre classes de processo; mapear os dados sobre mandados e oficiais de justiça que compõem a central de mandados: estatísticas sobre tempo, eficiência, grau de periculosidade, urgência, tipo de mandados; mapear fluxos da central de mandados.

Do ponto de vista do uso da IA, utiliza um algoritmo do tipo classificador ao distribuir as citações e intimações e um algoritmo parecerista ao elaborar os textos.

Interessante que a IA, ao distribuir os trabalhos aos oficiais, considera não apenas as distribuições geográficas e a carga de trabalho, mas a afinidade e capacidade com que um profissional comprovou ter com citações e intimações semelhantes, o que aumenta a probabilidade de sucesso na entrega. Sabemos o quanto esta expertise pode ser importante em uma situação envolvendo direito de família, por exemplo, onde a sensibilidade do profissional pode fazer toda a diferença.

 

O projeto Victor, do Supremo Tribunal Federal, faz a conversão das imagens dos processos digitalizados em textos e separa e identifica as peças processuais de acordo com os temas de repercussão geral. Em 2020 tinha uma taxa de acerto de 84%, o que demonstra que ainda existe um grande espaço para aperfeiçoamento. O objetivo da pesquisa é aumentar a velocidade de tramitação dos processos por meio da utilização da tecnologia a auxiliar o trabalho do Supremo Tribunal Federal. A máquina não decide e não julga – isso é atividade humana. Ela está sendo treinada para atuar em camadas de organização dos processos, a fim de aumentar a eficiência e velocidade de avaliação judicial. O projeto Victor envolve várias iniciativas e por isso o seu campo de aplicação tende a se ampliar cada vez mais.

Utiliza um conjunto de algoritmos classificadores, para avaliar a repercussão geral e outro parecerista (incipiente), ao elaborar os textos das decisões que posteriormente serão avaliadas pelos magistrados.

 

Elis – Tribunal de Justiça de Pernambuco. O Tribunal de Justiça de Pernambuco desenvolveu um sistema de inteligência artificial para atuar na Vara de Execução Fiscal capaz de analisar, triar, minutar e assinar os despachos iniciais de execução fiscal.

O sistema utiliza automação baseada em inteligência artificial para analisar divergências nas “CDAs”, realiza a triagem quanto à competência do juízo, verifica a prescrição, minuta e assina em lotes sucessivos e ininterruptos os despachos iniciais em execução fiscal no Processo Judicial eletrônico (Pje).  Foi escolhido um problema bem específico, delineado e com grande volume de dados – o que possibilita e justifica o desenvolvimento de uma solução de inteligência artificial.

Este é um exemplo de uso de um algoritmo classificador, parecerista e julgador utilizado para uma situação bem específica, repetitiva e delimitada. Sabemos que as execuções fiscais representam uma parcela significativa do total de processos ativos. São milhões de ações que possuem características comuns e podem ser agrupados para receberem movimentação conjunta, agilizar os procedimentos e o trâmite dos processos que, com o trabalho exclusivamente humano pode levar anos, mas com o uso de algoritmos de IA pode ser executado em horas.

 

Referências

 

Inteligência Artificial: Estudos de Inteligência Artificial. Fabiano Hartmann Peixoto (organizador). Quarto Volume.

Inteligência Artificial e Direito: Convergência Ética e Estratégica. Fabiano Hartmann Peixoto. Quinto Volume.

Ensinando um Robô a Julgar. Pragmática, discricionariedade, heurísticas e vieses no uso do aprendizado de máquina no Judiciário. Daniel Arruda Boing e Alexandre Morais da Rosa.

 

O impacto das decisões automatizadas no judiciário frente à privacidade    Julho 17 2022.

Palestrantes: Miguel Ramos, Bráulio Gabriel Gusmão e Gustavo Rocha

https://gustavorochacom.com.br/tag/inteligencia-artificial/

https://www.youtube.com/watch?v=tokuzrG0SMc

 

Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar. Daniel Kahneman

Ruído: Uma falha no julgamento humano. Daniel Kahneman

 

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NO PODER JUDICIÁRIO BRASILEIRO. CNJ.

https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/05/Inteligencia_artificial_no_poder_judiciario_brasileiro_2019-11-22.pdf

 

Resolução 332 CNJ. https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3429

 

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